20 novembro, 2008

Ofício 051/2008


ILMA. DRA. RAFAELLA ALBERICI.
PROCURADORA DA REPÚBLICA.
CRICIÚMA - SANTA CATARINA.



A Sócios da Natureza, Organização - Não Governamental, pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, de utilidade pública, fundada em 05.06.1980, com sede na Avenida Getúlio Vargas, 227, sala 09, Edifício Fronteira, município de Araranguá, neste Estado, neste ato representada pelo Coordenador Geral Thomaz L. Abati, vem mui respeitosamente perante V. Ex., INFORMAR E REQUERER, as providências administrativas e legais, sobre os fatos que passamos a narrar:


OS PLANOS DIRETORES DA AMESC, DO MUNICÍPIO DE ARARANGUÁ E A RELAÇÃO COM A DUPLICAÇÃO DA RODOVIA BR-101.
INTRODUÇÃO
Tentaremos descrever numa linguagem ‘’ongniana’’, ou seja, com um olhar sócio-ambientalista, um breve relato da situação dos Planos Diretores da região da AMESC, mais especificamente do Município de Araranguá e a relação dos mesmos com a Duplicação da rodovia BR-101 – Trecho Sul. O cenário ambiental do sul de Santa Catarina como já deve ser do conhecimento de V.Sa., é preocupante, haja vista ser considerada área crítica nacional pelo decreto federal nº. 85.206 desde 1980.
Oportunamente registramos que não tem sido fácil para nós como ONG trabalhar com as questões sócio-ambientais da região sul de Santa Catarina, principalmente da forma estrita e comprovadamente voluntária como fazemos desde 1980. A falta de recursos dificulta a dinâmica no confronto com o poder econômico e político, maiores responsáveis pelas agressões à natureza. Observando que muitas vezes somos incompreendidos por muitas autoridades, talvez porque não tenhamos tanto tempo para justificar nossas posições e atitudes, afinal apenas estamos tentando defender a natureza, registra-se que sem nenhum outro interesse que não o de exigir o cumprimento da legislação ambiental!
A poluição do carvão mineral comprovadamente é a que mais compromete o meio ambiente, se hoje fosse coletada água do rio Araranguá, o pH com certeza estaria entre 3 ou 4 de acidez, quando o normal para consumo é 7. Além da poluição do carvão, há a questão do agrotóxico, lixo, esgoto e da intensa quantidade de água utilizada de forma desordenada pela rizicultura. As enchentes da bacia hidrográfica do rio Araranguá causam transtornos para a população e tragédias como a do Natal de 1995, onde 29 pessoas perderam a vida.
Ainda dentro da concepção de ordenamento territorial e adequado uso do solo, iniciamos em 1998 com o apoio da sociedade civil organizada, um movimento pelo desvio da duplicação por fora do perímetro urbano de Araranguá, diga-se com sérios conflitos com os técnicos do DNIT (Doc. em anexo). Reivindicamos a DIREC/IBAMA apoio à criação de Unidades de Conservação com a destinação dos recursos das Medidas Compensatórias da duplicação, mas nada foram destinadas as mesmas, como nem para os Parques Nacionais. Uma enorme injustiça para com as áreas diretamente impactadas pela rodovia. (Doc. em anexo).
OBS. Muitos outros conflitos sócio-ambientais sem solução existem na região que Vossa Senhoria está assumindo, que nos colocamos a disposição para contribuir na tentativa de buscar as melhores soluções, como nos casos que citamos abaixo, excluindo a mineração do carvão de acordo com a informação que entendemos haver recebido na ocasião do evento do dia 15 em Araranguá, quando tivemos o prazer de conhecê-la pessoalmente:
1. Ilhas, foz e a pesca no Rio Araranguá.
2. Unidades de Conservação da AMESC.
3. Barragem do Rio do Salto.
4. Rizicultura.
5. Extração de seixo.
6. Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Araranguá.
7. Parques Nacionais dos Aparados da Serra.
8. Morro dos Conventos e o Gerenciamento Costeiro
9. Duplicação da rodovia BR-101.
10. Mata Atlântica, desmatamento e o RVS do ICM/BIO
11. Mudanças Climáticas: fenômenos e adversidades que ocorrem na região como as enchentes, tornados, ciclones e o furacão Catarina.
Na região da AMESC apenas o município de Araranguá e Sombrio são obrigados a implantar o Plano Diretor por possuírem mais de 20 mil habitantes. Outros municípios pequenos o são também pela relevância turística, como Praia Grande que injustamente não foi contemplada na lista dos municípios que ‘’ganhariam’’ o projeto do Plano Diretor, apenas a base cartográfica, resultantes das medidas compensatórias da Duplicação da BR-101. Medidas Compensatórias que infelizmente não estão compensando coisa alguma, já que quase nada está sendo investido na região impactada pela obra, conforme determina a resolução do CONAMA. (Doc. em Anexo).
O Município de Araranguá iniciou a discussão do Plano Diretor em 2002, promovendo duas audiências públicas com uma proposta de projeto que só abrangia o perímetro urbano. Portanto em desacordo com o inovador Estatuto da Cidade, que determina a abrangência de todo o território do município. Mesmo assim, a administração da época enviou ao Legislativo em 2004, mas as comissões técnicas nem colocaram em discussão no plenário devido à irregularidade.
A administração seguinte reativou o Conselho de Política Urbana-CPUMA objetivando a continuidade da discussão, ou seja, a procura de uma solução para o impasse, mas que não avançou por causa da indecisão/imbróglio entre o DNIT e a CODESC. O prazo estipulado pelo Ministério das Cidades para a conclusão dos PD venceu em 10 de Outubro de 2006. Tentamos motivar o CPUMA e a Administração Municipal a realizar as leituras comunitárias como forma de adiantar o processo, mas sem sucesso (Doc. em anexo). A interrupção das discussões em função do imbróglio promovido pelo DNIT e CODESC pode ter causado prejuízos irreparáveis ao município de Araranguá, mas também a todos os outros como, por exemplo, Criciúma, Içara, Tubarão, Laguna, Imbituba e Palhoça.
OBJETO DA LICITAÇÃO
Execução do Planejamento Macro (faixa lindeira à rodovia) e elaboração ou revisão de Planos Diretores nos municípios de Santa Catarina impactados pela obra de duplicação da rodovia BR-101, no trecho compreendido entre Biguaçu/SC e Passo de Torres/SC, de acordo com o Programa de Ordenamento Físico-territorial, relativo ao Projeto Básico Ambiental – PBA dentro do Projeto de duplicação da Rodovia Federal BR-101, correspondente ao trecho entre Florianópolis/SC e Osório/RS.
Finalmente solucionaram o imbróglio entre o convênio do DNIT e a CODESC para licitar a empresa que “elaborará’’ os Planos Diretores dos municípios contemplados com a medida compensatória da Duplicação da BR-101, como também encontraram uma fórmula de contornar a aplicação (do insuficiente recurso) das medidas compensatórias aos 38 municípios impactados. As causas do conflito entre o órgão federal e o estadual nunca ficaram bem esclarecidas para a opinião pública. A FECAM ameaçou entrar com ação judicial caso os órgãos não apresentassem sinais de que estavam tentando achar uma solução. Os desdobramentos destes desentendimentos ainda nos preocupam, pois podem ter deixado vícios administrativos.
Não ficou bem claro até onde vai o compromisso da empresa vencedora da licitação, mas se terão que cumprir o que está estabelecido no edital, ou seja, elaborarem os Planos Diretores de todos os municípios no tempo estipulado, será no nosso entender uma missão quase impossível. Por outro lado estávamos receosos com a possibilidade de uma empresa totalmente alheia a realidade local dos municípios vir a ‘’traçar seus respectivos futuros’’, agora ficamos ainda mais com a prometida consultoria depois da apresentação realizada dia 15 na SDR, em Araranguá, para os prefeitos e técnicos das prefeituras.
No nosso entender, pela extrema relevância do tema os encaminhamentos deveriam ter sido mais valorizados. Não fizeram um histórico, mesmo que breve, do por que e para que estavam ali, como também da importância do plano. Até nos pequenos detalhes pode-se avaliar se haverá dedicação ou se será na base do ‘’meio sola’’, como o fato de não terem utilizado microfone num local que exigia, pois quem estava sentado nos fundos da sala pouco deve ter ouvido, além da conduta pouco democrática do coordenador da empresa na condução dos trabalhos. Se o processo será conduzido da forma como fizeram na primeira apresentação, então muito pouco irá contribuir aos municípios.
Por motivo de força maior não ficamos até o final da apresentação, daí talvez não termos entendido o teor do edital, mas que aparentemente parece ser insustentável:
• Primeiro porque o valor de 6 milhões é muito baixo em relação ao valor da obra estipulada em mais de 1 bilhão de reais, considerando que a resolução do CONAMA determina o mínimo de 0,5 % sobre o valor da mesma.
• Segundo porque subtraindo os 2 milhões destinados a base cartográfica, entendemos que os 4 milhões não são suficientes para a elaboração de todos os Planos Diretores dos 38 municípios.
• Terceiro: quem irá fiscalizar o trabalho da empresa? Apenas a equipe técnica da prefeitura? Quem fiscalizará o trabalho de ambas? Apenas os Conselhos Gestores?
Não estamos seguros quanto à execução das responsabilidades apontadas no edital. Normalmente estes tipos de contratos ao final trazem mais vantagens às empresas, no caso a Herdt/Engemim. Não nos parece ser a forma mais correta e adequada de compensar os municípios, atribuindo a responsabilidade desta enorme empreitada à apenas uma empresa, afinal existem municípios grandes como Criciúma, Tubarão e Palhoça. A insustentabilidade da manobra proposta está explícita no nosso entender!
Senhora Procuradora, pode ser que estejamos sendo um pouco exigentes, mas ao longo destes 28 anos de existência da ONGSN aprendemos que o princípio da precaução ainda é a forma mais segura de evitar injustiças. Os nossos questionamentos são justificados por se tratarem da aplicação de recursos públicos, além da garantia da promoção de transparência e objetividade às ações, como por exemplo, a valorização às leituras comunitárias que indiscutivelmente são a base para um Plano Diretor participativo e abrangente, portanto, devem ser incluídas como primeira ação na elaboração dos Planos Diretores.
CONCLUSÃO
Plano Diretor é indiscutivelmente o projeto mais importante num município, além do planejamento territorial e adequado uso do solo, resultando quando bem elaborado e implantado, em mais qualidade de vida à população e ao desenvolvimento sustentável. Se mal elaborado pode comprometer tudo nos corações e mentes da população e dos administradores. O Estado criou a lei 10.257/2001 do Estatuto da Cidade para garantir a adequada aplicação das diretrizes discutidas entre o poder executivo, legislativo e a sociedade civil organizada. Os municípios com população acima de 20 mil habitantes que margeiam a rodovia BR-101 ficaram reféns das medidas compensatórias da duplicação, deixando de avançar na elaboração do Plano Diretor e descumprindo o prazo de 10 de Outubro de 2006.
• Questionamos se terá valido a pena a longa espera dos municípios em função da importância que é o Plano Diretor para o seu desenvolvimento e adaptação as vantagens que a rodovia trará com a duplicação?
• Questionamos a fórmula adotada pelo convênio DNIT/CODESC para cumprir com as medidas compensatórias.
• Questionamos a qualidade dos Planos Diretores sob a supervisão de uma única empresa, quando deveria ser no mínimo uma empresa por região ou que fosse feito o repasse aos municípios para que cada um fizesse de acordo com as suas peculiaridades e necessidades.
• Questionamos a imposição de técnicos alheios à realidade social e ambiental dos municípios. Deveria constar como obrigatório a contratação de técnicos locais para integrarem os trabalhos.
• Questionamos os prazos para a elaboração dos Planos Diretores, tendo em vista que até outubro nada que envolva público será permitido, como as leituras comunitárias que não poderão ser realizadas.
• Questionamos o nosso direito de exigirmos Planos Diretores tecnicamente bem elaborados e com a devida participação da população civil em todos os processos.
OBS. A empresa vencedora da licitação, consórcio paranaense Herdt/Engemin, precisará ter ‘’mais paciência’’ na abordagem e tratamento com os municípios, desde com os técnicos até com os segmentos organizados da sociedade civil, senão correrá o risco de não fazerem jus aos 4 milhões que irão receber da CODESC/DNIT.
OBS. As fotos não são atuais, quando deveriam, afinal custaram mais de dois milhões.
OBS. De acordo com o inovador Estatuto da Cidade, a população passa a fazer parte do processo de discussão e elaboração dos planos diretores, mas nenhum segmento organizado da região foi convidado para o evento de apresentação inicial.
Concluindo, solicitamos a Vossa Senhoria uma profunda investigação sobre a aplicação destes recursos públicos referentes às medidas compensatórias da obra de Duplicação da BR-101, mais esclarecimentos sobre o processo/manobra utilizada pelo DNIT e CODESC para cumprir com a legislação e a garantia de que a empresa irá tratar ‘’especificamente’’ o Plano Diretor de cada município de acordo com o Estatuto da Cidade.

Sem mais para o momento,
Atenciosamente

Tadeu Santos
Integrante da Coordenação
Araranguá – 21/07/2008.